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ARTIGO CIENTÍFICO - Pesticidas usados na cana-de-açúcar causam morte de tilápias
Data de Publicação: 6 de abril de 2024 09:23:00 No estudo foi utilizado técnicas avançadas de microscopia para examinar alterações celulares nas brânquias das tilápias expostas a esses pesticidas em condições controladas de laboratório. O trabalho teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (FAPESP) #Tilápias #Brânquias #Pesticidas #Microscopia #Alteraçõescelulares #Estudoexperimental #Laboratório #Pesquisacientífica #Impactoambiental #Toxicologia #FundaçãodeAmparoàPesquisa #Saúdeaquática #fapesp #rafaelrubira
Por Rafael J. Gonçalves Rubira*
A tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) está entre os peixes mais consumidos no Brasil e no mundo. Espécie originária da África, ela tem boa capacidade de adaptação a diferentes condições ambientais e apresenta crescimento rápido em cativeiro, a principal forma de abastecimento do mercado brasileiro.
Por sua presença à mesa, foi esse o peixe que escolhemos para um estudo realizado na Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) que investigou os efeitos de resíduos dos pesticidas parationa-metílica (MP) e imazapique (IMZ) sobre esse animal.
MP e IMZ são borrifados nas plantações de cana-de-açúcar na região de Presidente Prudente, interior de São Paulo. Devido à sua toxicidade, há uma preocupação crescente com os resíduos desses produtos no solo e na água, que podem afetar diretamente os ecossistemas aquáticos.
O IMZ é um herbicida seletivo autorizado para uso no Brasil no plantio do amendoim, arroz, cana-de-açúcar, milho, pastagem, soja, sorgo e trigo. Porém, é considerado altamente tóxico e pode causar danos ao meio ambiente e à saúde humana.
O uso da parationa-metílica (MP), do grupo dos organofosforados, é permitido até o limite de concentração de 9,3 microgramas por litro (µg/L) nos Estados Unidos, mas proibido no Brasil por seus efeitos tóxicos aos seres vivos.
No estudo que fizemos, utilizamos técnicas avançadas de microscopia para examinar alterações celulares nas brânquias das tilápias expostas a esses pesticidas em condições controladas de laboratório. O trabalho teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (FAPESP).
Brânquias ou guelras são órgãos respiratórios compostos por lamelas altamente vascularizadas que estão localizados na parte lateral da cabeça dos peixes. As lamelas absorvem oxigênio da água e eliminam dióxido de carbono, permitindo a respiração dos peixes em ambiente aquático.
A tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) está entre os peixes mais consumidos
no Brasil e no mundo (Foto: Antônio Oliveira/Cerrado Comunicação)
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A microscopia de fluorescência confocal é um tipo de microscópio óptico avançado que permite visualizar estruturas celulares ou subcelulares com alta resolução e sensibilidade. Ele utiliza luz fluorescente para destacar estruturas específicas dentro de uma amostra biológica. A técnica confocal elimina a luz dispersa fora do foco, resultando em imagens mais nítidas e contrastadas.
Isso é possível através de um sistema (pin hole) que permite a detecção de fluorescência apenas de uma pequena área focalizada da amostra e cria imagens tridimensionais de alta resolução.
Lesões e morte
O resultado dos testes feitos com tilápias em tanques de água no laboratório com diluição de pesticidas (em quantidades abaixo dos limites) revelou que os animais sofreram lesões significativas.
As análises microscópicas revelaram danos à integridade e funções das lamelas, comprometendo a capacidade dos peixes de absorver oxigênio da água.
Essas alterações nas brânquias levaram os peixes à morte por asfixia, evidenciando a sensibilidade das tilápias a esses pesticidas e os sérios impactos que podem causar na vida aquática.
O próximo passo será investigar as interações químicas nas moléculas de gordura desses órgãos. Usaremos um espectrômetro Raman, que permite estudar a resposta das células a estímulos com luz laser. As variações podem indicar possíveis alterações associadas a processos cancerígenos.
Os achados que fizemos até o momento com este estudo sugerem que a exposição prolongada das tilápias do Nilo estudadas aos pesticidas aumenta o risco de malformações, de problemas de desenvolvimento e reprodutivos.
As implicações para o meio ambiente do uso indiscriminado de pesticidas como o MP e o IMZ são vastas e profundas. A contaminação da água encabeça a lista de perigos, pois os pesticidas se infiltram no solo e podem alcançar corpos d'água, comprometendo fontes de água potável e ecossistemas aquáticos. O impacto recai sobre toda a cadeia alimentar aquática, incluindo organismos microscópicos, insetos e plantas.
A toxicidade dos pesticidas sobre organismos não-alvo é mais uma questão grave, atingindo insetos polinizadores, como as abelhas, e predadores naturais que desempenham um papel fundamental no equilíbrio ecológico. Isso pode levar a um aumento das populações de pragas e a uma diminuição da diversidade biológica.
Além disso, há riscos diretos à saúde dos trabalhadores e outras pessoas expostas aos resíduos de pesticidas, cujo efeito já foi relacionado por diversos estudos a alterações que vão desde distúrbios hormonais e no crescimento das crianças a problemas neurológicos e diversos tipos de câncer.
Não restam dúvidas de que medidas mais rigorosas são necessárias para fiscalizar e punir o uso e a aplicação dos pesticidas já proibidos no Brasil. Também são imprescindíveis os investimentos contínuos para a realização de mais estudos e monitoramento dos efeitos dessas substâncias no ambiente e na saúde coletiva.
Rafael J. Gonçalves Rubira
Físico, Ph.D pela Universidade de Málaga (com foco na análise dos efeitos de pesticidas em sistemas biológicos) e pesquisador da Faculdade de Ciência e Tecnologia , Universidade Estadual Paulista (Unesp)
Este artigo foi republicado do The Conversation. Leia a versão original clicando aqui
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