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MEMÓRIA – Dom Romerito e sua Clara: A roda da vida e a luz que parte

MEMÓRIA – Dom Romerito e sua Clara: A roda da vida e a luz que parte

Data de Publicação: 4 de março de 2025 13:43:00 Um tributo à saudade que permeia a vida após a partida da Dra. Clara, ao amor eterno que uniu Romero e sua amada, e à dor das despedidas que ecoam na memória e no coração.

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Uma das últimas fotos da Dra. Clara com o Romero (Foto: Acervo de família)

Por Antônio Oliveira

Há dias em que amanhecemos com aquele vazio no coração e na alma, uma saudade de algo que não se sabe o que é, como na Roda Viva do Chico Buarque – “Tem dias que a gente se sente/Como quem partiu ou morreu/A gente estancou de repente/Ou foi o mundo então que cresceu/A gente quer ter voz ativa/No nosso destino mandar/Mas eis que chega a roda-viva/E carrega o destino pra lá...”. Talvez seja em consequência do vazio que o trabalho deixa, que as festas de final de ano e o carnaval são tão difíceis para quem gosta da correria. Detesto essas datas; talvez seja a saudade que a alma sente dos bons momentos da vida, da ex-amada que se perdeu no tempo ou da nova amada, que está distante geograficamente; dos amigos – ou pseudo-amigos – que desapareceram das nossas vidas. Sei lá, ultimamente tenho vivido assim, mas tentando administrar a situação para não surfar na onda da melancolia e acabar afundando nas ondas da depressão.

Mas, como nos últimos anos, há um pequeno ser que amo tanto, tanto, que tem preenchido esses meus vazios com seu carinho, companheirismo, atenção e cuidados: minha neta Ana Clara, de 8 anos. Preenchendo o meu vazio de ontem, ela me chega com os pacotes de sementes de flores que compramos a pedido dela para plantar. E ainda não plantamos. Não dá para ficar com a alma e o peito vazios; mesmo porque ela roda à baiana, briga com charme e elegância, tudo brilha novamente.

Contudo, já no final da tarde, uma notícia vinda da minha querida Barreiras, no oeste da Bahia, me tirou o chão, e fui dormir sem ele: meu melhor amigo, Romero Amorim, perdeu sua amada, Maria Clara Amorim. A dor não é apenas pela perda de uma amiga, mas também por sofrer junto com meu amigo e por não ter podido estar ao lado dele neste momento difícil. Na surpresa do acontecimento e na providência da vinda dos filhos e demais familiares de outro estado, ele esqueceu de me avisar. Compreendo. Alguém que não me viu por lá foi quem me comunicou o fato.

Romero é um daqueles homens raros no mundo: com visão empreendedora, ético, meigo, companheiro e voltado tanto para si quanto para seus entes familiares, além de se preocupar com a sociedade em que vive, principalmente com os mais carentes de pão, poesia, cultura e trabalho. Chegou a Barreiras em missão de trabalho, pouco tempo depois de se casar com sua Clara. Amou a cidade, iniciou um negócio e foi buscar sua alma gêmea. Prosperou e fez a diferença na vida empresarial, econômica e social de Barreiras e microrregião. Tenho com ele e a Dra Clara, uma das melhores odontólogas que Barreiras já teve, uma amizade de mais de 40 anos. Eles nunca me faltaram. Sou muito feliz e grato por Romero ter me dado a responsabilidade de biografar – na verdade um ensaio biográfico, pois alcançar 100% de sua vida, não é para qualquer um. A obra está na fase de pré-impressão

Além de ser um homem de visão no mundo dos negócios, na abertura de fronteiras e no pioneirismo na região, na área dos agronegócios, Romero é daqueles  homens raros que trazem no coração um grande e verdadeiro amor por sua namorada e esposa. Ele cumpre fielmente o juramento feito aos pés do altar durante a cerimônia de casamento: "Eu prometo te amar, respeitar e apoiar em todos os momentos da nossa vida juntos. Farei isso até que a vida nos separe, com todo o meu coração." E assim ele fez.

Tenho sempre na memória cenas de ternura e companheirismo na vivência dos dois: os passeios juntos, a ida ao Carnaval do Recife, os almoços com gostosos bate-papos no Cheiro Verde, restaurante próximo aos locais de trabalho deles, onde amor e respeito se manifestavam na saúde.

Uma das últimas fotos de Romero e Clara com seus filhos,
netos, genro e nora (Foto: Acervo de família)

Amor, carinho e ternura na dor. Há dez anos, a Dra. Clara entrou num processo de degeneração física, ocasionado por uma doença que faz com que a pessoa perca gradativamente a memória, a fala e os movimentos. Ela passou a vegetar, prostrada numa cama ou em uma cadeira de rodas. Dom Romerito, como gosto de chamá-lo de forma carinhosa, esteve sempre ao lado dela. Em casa, reproduziu a decoração do consultório dela e, além de manter uma fisioterapeuta, uma nutricionista e uma cuidadora ao seu lado, contribuía para a antiga vaidade de sua amada. Ela estava sempre arrumada, linda, cercada de amor, carinho e cumplicidade. Até o dia em que ela partiu, ele mantinha o hábito de levá-la à missa das manhãs na Catedral São João Batista – a transportava na cadeira de rodas.

Durante o período de doença da Dra. Clara, ele jamais saía de casa sem informá-la para onde ia, quando voltaria e sempre se despedia ou chegava com um beijo. Era uma linguagem que, da parte dele, saía do coração, passava por suas cordas vocálicas e, dela, entrava pelos olhos, sendo interpretada pela alma.

Certo dia, ao dormir em sua casa para voltar a Palmas no dia seguinte, nas primeiras horas da manhã, ele me pediu para acordá-lo, pois pretendia me levar à rodoviária. Estava muito cansado e temia não acordar na hora certa. Assim, o fiz e deparei-me com uma cena de rara beleza: ele dormia abraçadinho com a sua alma gêmea.

Que Deus ilumine a nossa querida Dra. Clara neste momento de transição do material para o espiritual, e que nas orações de meu amigo Dom Romerito, de seus filhos – Marília e Romerinho –, de seus irmãos e de uma imensa legião de amigos, encontre conforto e paz.

MEMÓRIA 

***

“No vazio da alma, a saudade flutua,
Entre risos e lágrimas, o amor se perpetua.
Com filhos e amigos ao lado, flores vão brotar,
Enquanto a dor ensina, é o amor que vai amar.”

(Antônio Oliveira)

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