Português (Brasil)

ENTREVISTA – Especial Dia da Mulher: Tsylla Balbino, da rebeldia de Woodstock a produtora de café especial na Chapada Diamantina

ENTREVISTA – Especial Dia da Mulher: Tsylla Balbino, da rebeldia de Woodstock a produtora de café especial na Chapada Diamantina

Data de Publicação: 7 de março de 2023 16:24:00 Uma bela história de uma mulher que deixou uma bela carreira de professora de uma binacional para empreender na agricultura na Chapada Diamantina. “Eu pensava em ter uma pequena propriedade para uma futura aposentadoria, mas acabei me apaixonando por uma fazenda de nome Santo Antônio do Cafezal e, assim, começou a minha relação com a cultura do café”, diz ela, entre outros emocionantes depoimentos que nos chamam a reflexão sobre a agropecuária brasileira #dia da mulher #entrevista #tsylla Bal

Compartilhe este conteúdo:

 

Tsylla Balbino, professora e empreendedora rural (Foto: acervo pessoal)

 

Por Antônio Oliveira

Fui um dos pioneiros na primeira emissora de rádio de Barreiras, no oeste da Bahia, de propriedade majoritariamente da família Balbino de Carvalho, cuja maior expressão foi o advogado e pecuarista, nascido em Barreiras,  Antônio Balbino de Carvalho (1912/1992), que, entre 1937 e 1971, foi deputado federal; ministro da Educação e Saúde, no governo de Getúlio Vargas; governador da Bahia; ministro dos negócios da Indústria e Comércio, do governo João Goulart e, finalmente, senador até 1971, quando deixou de vez a vida pública e voltou a advogar grandes causas na cidade do Rio de Janeiro até morrer, sem antes, em 1988, nos entregar “um presente para Barreiras”, a Rádio Barreiras.

Anos depois - por meio de um e-mail que,  sabe-se lá como, caiu em caixa errada -, conheci Tsylla Balbino, a nossa entrevistada desta terça-feira. Tsylla, era a neta dileta do grande Antônio Balbino, avô extremamente carinhoso. É filha do deputado federal por vários mandatos, Ney Ferreira (1929/2011) e sobrinha de um dos homens mais inteligentes que a Bahia já deu ao Brasil, o engenheiro Geraldo Rocha - quem inspirou a criação da Codevasf, após conhecer os vales dos principais vales do mundo e mostrar, em livro, que o vale do Rio São Francisco poderia abastecer o Brasil, com excedente para exportação.

Durante esta amizade, já estive com a Tsyla por duas vezes em passeio de descanso nas suas fazendas, na Chapada Diamantina; em sua casa em Brasília, e em viagens pelo Tocantins mostrando projetos agrícolas – ela, mais tecnológica que eu, no GPS e eu, no mapa impresso. Só encontramos rumos depois que joguei meu mapinha fora. Foi a grande oportunidade de conhecer o extraordinário ser humano que ela é: ética, humilde, inteligente, esquerdista equilibrada, naturalista. Tsyla, uma das prefaciadoras de um dos meus livros, é da geração que fora influenciada por movimentos como a contracultura, manifestada, principalmente, pelo Festival de Woodstock (Hair - Let The Sunshine In) – completamente controversa a tradição social, econômica e política de sua família – a mãe, dona “Ziza”, presidente do conselho dela é que era cúmplice de Tsylla.

Com este ideal, um dia comprou uma bela fazenda na Chapada Diamantina, no estado da Bahia. Objetivo: curtir a natureza e desenvolver um projeto social voltado para pequenos produtores ao redor da propriedade.

Mais tarde, teve a oportunidade de agregar mais duas pequenas fazendas em torno da primeira aquisição, formando a “Fazendas Reunidas Novo Tempo”. Mas o que seria um projeto naturalista, social, refúgio, tornou-se uma fazenda bem produtiva, diversificada, modelo.

(Foto: acervo de família)

 

- Não me considero como uma “mulher do agro”! Sou uma educadora que resolveu investir a sua aposentadoria no processo de aprender a lidar com a terra. Tenho uma visão romântica da vida na roça. Acredito que me descobri como ser a medida que fui aprendendo que o tempo da natureza é muito próprio e ajuda a melhor entender a nossa insignificância diante da vida. Não trato a minha relação com as fazendas como negócio e acabo sendo mal compreendida – ela se define.

Tsylla é um dos grandes exemplos de produção socioambiental na agricultura e, levando-se em conta o Dia da Mulher, comemorado nesta quarta-feira 8, COFARMNEWS a convidou para esta entrevista que é a nossa homenagem a mulher que vive e melhora conceitos do agro.

Segue a íntegra da entrevista.

 

Centro-Oeste Farm News (COFARMNEWS) - Olá, Professora Tsylla. Temos muito prazer em tê-la como nossa entrevistada.

Tsylla Balbino – Antônio,  eu que agradeço a oportunidade de falar com tão respeitado jornalista e, acima de tudo, um bom amigo.

COFARMNEWS - Qual é a sua formação acadêmica, professora?

Tsylla Balbino  - Eu sou formada em letras pela Universidade de Brasília (UnB); tenho mestrado em Metodologia de Ensino e Aprendizagem pela School For International Training, Vermont- USA e, também, pela mesma instituição,  tenho uma especialização em Gestão Acadêmica. Tenho também formação em Psicologia Transpessoal, pelo Instituto Dinâmica Energética do Psiquismo e Pós graduação na mesma área pela Universidade da Luz em Nazaré Paulista - SP. Tenho formação em Yoga e Vedanta e mais recentemente resolvi investir em alguns cursos de gestão na área cafeeira e de cítrus. Em resumo uma formação bem eclética.

COFARMNEWS - O que a senhora pretendia, quando deixou a direção de duas emissoras de rádio da família, na cidade de Barreiras (BA), para investir numa fazenda cafeeira na Chapada Diamantina (BA)?

Tsylla Balbino - Eu não desisti da área de comunicação social, no caso das rádios Barreiras e FM Líder, em Barreiras. Eu cumpri uma missão. Eu assumi a direção de ambas as rádios em 2004 quando um problema de saúde impediu que meu pai continuasse à frente das mesmas. Com a passagem dele pra o plano mais alto, em 2012, eu dei a minha missão por encerrada e deixei a direção nas mãos dos verdadeiros concessionários das rádios - meus irmãos e primos. O encontro com a cultura cafeeira se deu por acaso. A Chapada Diamantina estava no meio do caminho entre Barreiras e Salvador e acabou se tornando uma grande paixão nas minhas descobertas de trilhas e encontros de auto-conhecimento. Eu pensava em ter uma pequena propriedade para uma futura aposentadoria, mas acabei me apaixonando por uma fazenda de nome Santo Antônio do Cafezal e, assim, começou a minha relação com a cultura do café, lembrando que ao sair das rádios eu voltei a Brasília e por seis anos toquei concomitantemente meu trabalho de Orientação e Formação de Professores em uma renomada Instituição Binacional e as fazendas na Chapada Diamantina. E tudo isso só mudaria de vez com a chegada da pandemia em 2020, quando saí de Brasília e passei a me dedicar só as fazendas.

(Tsylla com seus parceiros na gestão das fazendas (Foto: acervo de família)

COFARMNEWS - O que a moveu, anos depois, a investir de fato no agronegócio do café especial?

Tsylla Balbino - O negócio do café especial foi chegando aos poucos, à medida que eu aprendia mais sobre essa cultura tão apaixonante e cheia de nuances. Há muitos detalhes na produção do café arábica e em particular do café especial ou gourmet. Tudo precisa ser muito pensado e cuidado, desde a escolha de sementes de boa procedência e cultivares ou variedades que possam levar a um trato com menor uso de defensivos até uma pós colheita logisticamente viável e rentável.

COFARMNEWS - A tradição familiar pecuarista a ajudou?

Tsylla Balbino - Apesar de fazer parte de uma família de pecuaristas, a minha decisão por lidar com a cultura do café e posteriormente com outras frutas como morango, maracujá, tangerina, limão siciliano, abacate, melancia e banana e até mesmo com eucalipto e látex tem zero influência da família. Na verdade, é um projeto totalmente solo e com pouco ou nenhum incentivo familiar.

COFARMNEWS - Sob o ponto de vista econômico, compensou; correspondeu com suas expectativas?

Tsylla Balbino  - Sob o ponto de vista econômico esse projeto ainda não se tornou totalmente viável, mas digamos que isso se deve ao meu amadorismo e, também,  ao perfeccionismo. As dificuldades de crédito são grandes, os prazos para financiamentos de custeio são curtos demais e a mão de obra durante a colheita é de 30% do valor a ser apurado. E em se tratando de uma commodity, o café tem um preço que oscila muito. Eu, por exemplo, tive a minha maior safra no ano em que o café teve o menor preço por saca e acabei pagando para vender café.

COFARMNEWS -  Hoje são três fazendas reunidas e com produção diversificada. Como foi, e está sendo, este processo?

Tsylla Balbino - A diversificação de culturas foi o que tornou as fazendas viáveis. As demais culturas são responsáveis por garantir o pagamento da folha e de algumas despesas básicas, mas o pesado, especialmente os insumos, ainda dependem majoritariamente da renda do café.

COFARMNEWS - A senhora se realiza como mulher do agro? O que isto representa para seu vasto currículo?

(Foto: acervo de família)

 

Tsylla Balbino - Não me considero como uma “mulher do agro”! Sou uma educadora que resolveu investir a sua aposentadoria no processo de aprender a lidar com a terra. Tenho uma visão romântica da vida na roça. Acredito que me descobri como ser a medida que fui aprendendo que o tempo da natureza é muito próprio e ajuda a melhor entender a nossa insignificância diante da vida. Não trato a minha relação com as fazendas como negócio e acabo sendo mal compreendida. Tenho uma visão muito particular e pouco comum a quem vive do agro. Sou uma ambientalista de carteirinha e acredito de verdade que há inúmeras maneiras de produzir sem explorar e principalmente sem esgotar os recursos naturais. Nas minhas fazendas eu cultivo 20% da área e mantenho 80% de área nativa que ajuda a garantir que recursos importantes como insetos e outras defesas naturais atuem na proteção daquilo que cultivo. Acho importante que se invista na proteção das nascentes de rios e manutenção de floresta nativa em pé.

COFARMNEWS - Essa ojeriza ao Agro por boa parte dos urbanos procede?

Tsylla Balbino - O agronegócio no Brasil, por vezes, parece ser muito ganancioso, mas não vejo razão para ojeriza ao agro, se bem que acredito que ainda há muito o que aprender por aqueles que creem que os nossos recursos naturais são inesgotáveis e que mudança climática é história da carochinha.

COFARMNEWS – Se tivesse que mudar velhos conceitos do agro, qual seria sua orientação.

Tsylla Balbino - Acho que velhos métodos de exploração da terra e dos recursos naturais tem muito o que aprender com práticas como a da agrofloresta e da permacultura e essas associadas a modernidade da tecnologia, muito desenvolvida tanto para a agricultura quanto para pecuária, poderiam produzir muito sem devastar a natureza e assim dar mais oportunidades ao desenvolvimento e crescimento da agricultura familiar sustentável e bem orientada para o bem social e ambiental.

 

 

Compartilhe este conteúdo:

  Seja o primeiro a comentar!

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site. Envie seu comentário preenchendo os campos abaixo

Nome
E-mail
Localização
Comentário