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MULHERES DA AQUICULTURA – “Existem criaturas extremamente inteligentes, visionárias, determinadas, proativas, humanas, que fazem acontecer, independente se são homens ou mulheres”, diz a carcinicultora Ana Carolina
Data de Publicação: 25 de abril de 2023 16:30:00 Bióloga Marinha e carcinicultora no Rio Grande do Norte, Ana Carolina, é a quinta entrevistada desta série com mulheres da aquicultura. Neste bate-papo, que teve como convidado o jornalista paulista Altair Albuquerque, ela fala de sua liderança feminina, da carreira profissional e da carcinicultura no Brasil Por Antônio Oliveira Leia a entrevista completa acessando o blog do autor no COFARMNEWS
Por Antônio Oliveira
Bióloga Marinha por formação e carcinicultora exemplar pela prática, Ana Carolina Barros Guerrelhas, do Rio Grande do Norte, é moderada em relação a posição da mulher nas diferentes atividades humanas. “Sempre trabalhei mais com homens e tenho as frentes perfeitas para os homens e as frentes ideais para mulheres. O que tento fazer é colocá-los onde se desempenham melhor”, ensina.
Ana Carolina, nesta entrevista, é uma indicação da Oceanógrafa Fernanda Queiroz e Silva, que a antecedeu nesta série. “Há décadas, (Ana Carolina Barros Guerrelhas) trabalha na Aquicultura, sendo um exemplo de força da mulher no nosso setor”, afirma Fernanda Queiroz e Silva, cuja entrevista você lê clicando aqui.
Nesta entrevista que tem o jornalista paulista Altair Albuquerque como convidado, a profissional dá o tom de sua força: “Diria que enfrento os mesmos desafios que todos, sejam homens ou mulheres, mas a diferença é que ‘não desisto fácil’, o Universo conspira a meu favor, e tenho o ‘respeito’ das pessoas pelos exemplos e contribuições ao longo destes 45 anos dedicados a Aquicultura” e fala sobre as dificuldades e conquistas da carcinicultura brasileira.
Segue a entrevista.
"Diria que enfrento os mesmos desafios que todos,
sejam homens ou mulheres, mas a diferença é que
“não desisto fácil”, o Universo conspira a meu favor"
(Foto: Acervo pessoal)
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Centro-Oeste Farm News (COFARMNEWS) – Doutora Ana, que prazer ter a senhora nesta série que tem foco nas mulheres que fazem da aquicultura brasileira uma das mais dinâmicas do mundo.
Ana Carolina Barros Guerrelhas – É uma satisfação grande poder dividir um pouco minha história. Agradeço a indicação de Fernanda Queiroz, que sendo tão jovem já inspira tantas mulheres, inclusive a mim. Tenho muita afinidade e admiração pela Fernanda.
COFARMNEWS – Gostaria que a senhora discorresse um pouco da sua carreira acadêmica, profissional e empreendedora.
Ana Carolina – Sou Bióloga Marinha, formada pela USP e Especialização em Oceanografia Biológica também pela USP, no Instituto Oceanográfico. Logo após, tive meu primeiro emprego na SUDEPE/MA (Superintendência de Desenvolvimento da Pesca), analisando e acompanhando projetos de pesquisa das universidades e os primeiros projetos de cultivo de camarão no RN onde toda a história da carcinicultura iniciou. Entrei na iniciativa privada no projeto piloto de engorda de M. rosenbergii, (camarão de água doce), no Amapá, na empresa ICOMI – Indústria e Comércio de Minérios S/A, junto com uma empresa americana detentora da tecnologia na época . Minha segunda experiencia na iniciativa privada foi na Bahia, com o camarão marinho (L. vannamei), para produção de formas jovens – pós-larvas, na empresa Maricultura da BA Ltda. Realizei algumas consultorias na área de projetos e implantação de Laboratórios de produção de pós-larvas de camarão marinho. Finalmente, tive a oportunidade de entrar como sócia da empresa Aquatec Aquacultura Ltda, produção de pós-larvas de camarão marinho, desde 1988, onde estou até hoje. Essa riqueza de experiencias em pesquisa, órgão público, iniciativa privada e consultorias foram muito importantes para o sucesso na minha vida profissional.
COFARMNEWS – A SUDEPE teve, então, papel importante na sua carreira e na carcinicultura brasileira!
Ana Carolina – A SUDEPE queria incentivar a carcinicultura nas áreas onde era produzido sal que entrou em decadência pelos baixos preços na época. Como poucas atividades se desenvolvem nas áreas inóspitas de salinas a Carcinicultura Marinha apareceu como uma excelente oportunidade - nos anos 80, para precisar uma época. Bem no início se usava as espécies nativas – camarão rosa e camarão branco; depois foi introduzida uma espécie asiática – camarão Kuruma ou camarão tigre japonês -, mas não se mostrou muito apropriada para o manejo usado na época. A partir de 1990 começou a se importar reprodutores de outra espécie, camarão cinza ou “vannamei”, do Pacífico e esta foi um sucesso absoluto e é quem garante a produção anual de 150.000 toneladas no Brasil. É uma espécie que consolidou a indústria de camarão cultivado no Brasil.
COFARMNEWS – A carcinicultura é um dos ramos da aquicultura que tem o predomínio dos homens. Como é, para a senhora, estar em posição de liderança entre eles, principalmente entre colaboradores?
Ana Carolina – Comecei a trabalhar em campo na Carcinicultura em 1981 e era muito mais difícil a aceitação de uma mulher na posição de liderança, principalmente porque as fazendas eram no Norte e Nordeste do Brasil. Minha educação familiar e cultural foi em São Paulo e, de forma alguma, éramos preparados para trabalhar em outras regiões com diferenças tão acentuadas. Mas como sou pernambucana por parte de mãe, e tenho muita afinidade com o clima do Nordeste, resolvi encarar o desafio e insistir. Tive poucas situações de atritos, concorrências desleais e desrespeito moral, porque a imposição de uma postura profissional e humana acabaram por impor limites e muito respeito. Quando lembro, hoje, de meu início e comparo com as dificuldades que outras mulheres tiveram ou tem, me considero uma mulher de “sorte”.
COFARMNEWS – O Brasil seria melhor se a maioria de seus líderes, em todos os campos da atividade humana, fosse mulher?
Ana Carolina – Não. Existem criaturas extremamente inteligentes, visionárias, determinadas, proativas, humanas, que fazem acontecer, independente se são homens ou mulheres. Sempre trabalhei mais com homens e tenho as frentes perfeitas para os homens e as frentes ideais para mulheres. O que tento fazer é colocá-los onde se desempenham melhor.
COFARMNEWS – A carcinicultura no Brasil passou por e superou vários obstáculos. Mas ainda continua enfrentando outros, como a exportação do camarão para outros países. Os poderes públicos e a iniciativa privada estão no caminho da reabertura de mercados externos?
Ana Carolina – Desde que comecei a trabalhar na inciativa privada aprendi que quem abre um caminho, uma indústria, um comércio específico, é a iniciativa privada. O poder público vem com as legislações, regras tributárias, relações internacionais e/ou estaduais. Neste sentido, diria que a inciativa privada e suas parcerias políticas e públicas estão trabalhando na reabertura do mercado externo. Lembrar, entretanto, que temos um mercado interno monstruoso, muito cobiçado por outros países, que também precisa ainda ser bem trabalhado.
COFARMNEWS – Que contribuição a Aquatec tem dado para o desenvolvimento da carcinicultura, especialmente a do Nordeste brasileiro?
Ana Carolina – A Aquatec foi o 1º Laboratório que tornou possível a entrada de pescadores e pequenos produtores na carcinicultura, sem pescar as pós-larvas no ambiente natural. Como na época os investidores queriam ter viveiros de engorda, a Aquatec foi a fornecedora inicial de pós-larvas para a maioria dos grandes projetos de hoje. Por ter uma visão muito técnica e ter começado sozinha fixou padrões de qualidade fortes na época que perdurou por alguns anos até que outros laboratórios começaram a aparecer. O primeiro programa de melhoramento genético para esta espécie vannamei no Brasil foi implantado pela Aquatec e perdura até hoje. É importante também mencionar a formação de mão de obra qualificada para produção de formas jovens, uma vez que já passaram em nossas mãos cerca e 1000 funcionários.
COFARMNEWS – As pesquisas e as novas tecnologias têm correspondido com as expectativas da carcinicultura brasileira?
Ana Carolina – Diria que algumas universidades têm feito diversas pesquisas sobre camarão marinho com intuito de trazer inovações à indústria, bem como organizar treinamentos para os novos investidores. Isto não quer dizer que todos os problemas enfrentados pela indústria são pesquisados para encontrar soluções ou alternativas. O ideal é que é houvesse mais comunicação entre Universidade e iniciativa privada para que a primeira conhecesse de perto os problemas da indústria e com aporte financeiro complementar dirigisse as pesquisas para atender as demandas dos produtores.
COFARMNEWS – As próximas três perguntas vêm do jornalista paulista, Altair Albuquerque, nosso convidado especial para participar desta entrevista.
Altair Albuquerque – Ana, a carcinocultura brasileira está renascendo depois de um período difícil. Podemos dizer que a cadeia produtiva já está normalizada ou ainda tem reflexos da questão sanitária ocorrida no passado?
Ana Carolina – A Carcinicultura está passando por um processo de expansão de produção principalmente em pequenos e micro produtores e em áreas interiores do país, com águas pouco salinas. Este perfil de produtor adota manejos similares aos que dão certo nos vizinhos, preferem manejos simplificados, não controlam de perto os custos, e não investem em tecnologia. As doenças são comuns em qualquer atividade de confinamento, seja água, ar ou terra. Penso que hoje é mais prioritário organizar esta entrada grande de pequenos projetos com manejos simples do que pensar o que fazer com a doenças. Doença tem a ver com “educação” e “mentalidade” do produtor e das associações que reúnem os produtores e só uma ação conjunta e ordenada pode mitigar os problemas causados por ela.
Altair Albuquerque – Falo por mim, mas acho que é consenso que o brasileiro gosta muito de camarão – apesar de achar o preço um pouco salgado, especialmente aqui no Sudeste. Mas como o consumidor pode saber que aquele camarão que encontra no supermercado é brasileiro ou importado?
Ana Carolina – É uma boa pergunta. Se é importado e mantido na embalagem original, você sabe que é importado. Mas se foi importado e reembalado fica difícil dizer. Eu não sei como separar. Conheço as marcas nacionais e acredito que não são reembaladas, mas fica a dúvida.... É bom frisar que 70% do camarão marinho que o brasileiro consome hoje é “cultivado” e não pescado.
Altair Albuquerque – Lugar de mulher é onde ela quiser. Mas vamos combinar que uma mulher produtora de camarão não é comum. Você enfrenta desafios por ser mulher numa atividade tão específica como a carcinocultura?
Ana Carolina – Diria que enfrento os mesmos desafios que todos, sejam homens ou mulheres, mas a diferença é que “não desisto fácil”, o Universo conspira a meu favor, e tenho o “respeito” das pessoas pelos exemplos e contribuições ao longo destes 45 anos dedicados a Aquicultura.
COFARMNEWS – A carcinicultura tem merecido o devido apoio dos governos dos estados e da União?
Ana Carolina – Não tem recebido o “devido” apoio, talvez porque os volumes e cifras gerados pela carcinicultura ainda não são expressivos quando comparados com outras culturas. Mas, acredito que nossos números vão aumentar e vão impressionar e neste momento chamará a atenção.
COFARMNEWS – Na sua opinião, qual seria a plataforma de governo – da União e dos estados – para o pleno desenvolvimento da carcinicultura, da produção ao processamento e exportação?
Ana Carolina – Acredito que programas de extensão (técnica) voltados para carcinicultura de pequenos produtores; simplificar o acesso às fontes de financiamento e ao crédito em si; simplificar os processos para a regularização da Legislação Ambiental e menos burocracia e mais agilidade nos processos de qualquer esfera.
"O primeiro programa de melhoramento genético
para esta espécie vannamei no Brasil foi implantado
pela Aquatec e perdura até hoje"
(Foto especial para o COFARMNEWS
(Equipe Aguatec)
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COFARMNEWS – Nós agradecemos, mais uma vez, por esta oportunidade de tê-la como uma das nossas entrevistadas. Colocamos o espaço à sua disposição para mais alguma informação que achar necessária e, como de praxe desta série gostaría que a senhora indicasse a próxima entrevistada.
Ana Carolina - Eu agradeço a oportunidade de participar desta série de entrevistas e poder mostrar um pouco de minha profissão e vivência na iniciativa privada e espero que possa servir de inspiração e alento que aqueles e aquelas que já estão na Aquicultura ou pretendem entrar. Gostaria de indicar uma pessoa muita amiga e especial. É a Marcia Kafensztok. Marcia é designer de profissão, casada com um Biólogo Marinho, carcinicultor e ostreicultor na região de Piau/RN - Primar e, que infelizmente, teve sua vida interrompida inesperadamente. Marcia resolve assumir e liderar o projeto de produção, pesquisa, ensino e social tão sonhado por ele. É uma mulher muito interessante.
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